Filme: Acorda, Raimundo, acorda!
Assista no Youtube:
Parte 1: http://www.youtube.com/watch?v=Rd6BiFzeaSM
Parte2: http://www.youtube.com/watch?v=1AbE4c5egIM
Artigos de jornal:
Violência contra a mulher: http://www.divshare.com/download/11763164-29f
Mulheres chefes de família: http://www.divshare.com/download/11763163-ade
Textos selecionados:
UM DIA DA MULHER MINEIRA
Domitila Barrios
Meu dia começa às 4 horas da manhã, especialmente quando meu companheiro está no primeiro turno. Então eu preparo o seu café da manhã. Em seguida preparo as salteñas (,Empanada típica boliviana, recheada com carne, batata, pimenta e outros condimentos (um tipo de pastel feito com massa de pão) porque faço umas cem por dia e vou vendê-las na rua. Faço isso para completar o que falta ao salário do meu companheiro, para satisfazer as necessidades do lar. Na véspera, preparamos a massa e às 4 da manhã faço as salteñas, enquanto dou de comer aos pequenos. Os pequenos me ajudam: descascam as batatas, cenouras, preparam a mesa.
Depois tenho que aprontar os que vão à escola na parte da manhã. Em seguida, lavar a roupa que deixei enxaguada na véspera.
Às 8 saio para vender. Os pequenos que vão à escola na parte da tarde me ajudam. È necessário ir ao armazém e trazer os artigos de primeira necessidade. No armazém fazem filas imensas e fica-se até às 11 horas pra se abastecer de alimentos. Fila para a carne, para a verdura, para o óleo. Para tudo é preciso fila. É assim porque cada coisa está num lugar diferente. Então, enquanto vou vendendo as salteñas, faço fila para abastecer-me no armazém. Corro na janelinha para buscar as coisas e os meninos ficam vendendo. Depois os meninos vão ficar na fila e eu vendo. Assim.
Das cem salteñas que preparo, tiro uma média de 20 pesos diários, pois se vendo todas num dia, ganho 50 pesos; mas, se amanhã vendo somente 30 salteñas então perco. Por isso digo que a média de meu lucro é de 20 pesos por dia. E eu tenho sorte porque as pessoas me conhecem e as compram de mim. Algumas das minhas companheiras chegam a tirar somente de 5 a 10 pesos por dia.
Do que eu e meu marido ganhamos, comemos e vestimos. O alimento está bastante caro: 28 pesos o quilo de carne; 4 pesos a cenoura; 6 pesos a cebola... Se pensarmos que meu companheiro ganha 28 pesos por dia apenas dá para viver, não é?
A roupa custa mais caro. Então procuro costurar tudo que posso. Não compramos roupa para o frio. Compramos lã e tecemos (...)
Bem, das 8 até a 11 da manhã vendo as salteñas, faço as compras no armazém e faço também meu trabalho no Comitê de Donas de Casa, conversando com as companheiras que também vêm fazer compras.
Ao meio dia, o almoço tem que estar pronto porque os outros meninos têm que ir à escola.
Na parte da tarde, tenho que lavar roupa. (...)
Também tenho que corrigir as tarefas dos meninos e preparar todo o necessário para as salteñas do dia seguinte. (...)
Não há fonte de trabalho para as mulheres. Não só para elas como também para os jovens que voltam do quartel. E a desocupação torna nossos filhos irresponsáveis, porque eles se acostumam a depender de seus pais, de sua família. Muitas vezes se casa sem ter trabalho e então vêm viver na casa com sua companheira.
Então, é assim que vivemos. Assim é nossa jornada. (...) Durmo então 4 a 5 horas. (...)
Bem, penso que com tudo isso fica claro como o mineiro é explorado duplamente, não é? Porque, o salário sendo tão pouco, a mulher tem que fazer muito mais coisas no lar. E isto é uma obra gratuita que ao final das contas estamos fazendo para o patrão, não é?
E, explorando ao mineiro, exploram também não só a sua companheira mas também até os seus filhos. Isto porque os afazeres domésticos são tantos que até as criancinhas as fazemos trabalhar (...)
Mas, apesar de tudo o que fazemos, ainda existe a idéia de que as mulheres não realizaam nenhum trabalho, porque não contribuem economicamente para o lar; que somente o marido trabalha porque ele recebe um salário. Nós temos tropeçado bastante com esta dificuldade.
Um dia me ocorreu a idéia de fazer anotações num quadro. Pusemos, como exemplo, o preço de roupa lavada por dúzia e verificamos quantas dúzias de roupas lavávamos por mês. Depois, o salário de uma cozinheira, de uma babá, de empregada. Verificamos tudo o que fazem todos os dias as esposas dos trabalhadores. No total, vimos que o salário necessário para pagar o que fazemos na casa, comparado com os salários de cozinheira, lavadeira, babá, empregada, era maior que o que ganhava o companheiro durante um mês na mina. Então, assim fizemos os nossos companheiros compreender que, em certo sentido, trabalhamos mais que eles. E que inclusive contribuíamos mais dentro do lar com o que economizamos. Assim que, apesar de que o Estado não reconheça o trabalho que fazemos na casa, o país se beneficia de nosso trabalho e também o governo se beneficia, porque deste trabalho não recebemos nenhum salário.
INSANIDADE, CRUELDADE OU PRINCÍPIOS CRISTÃOS?
Católicas pelo direito de decidir
O que pode levar alguém a desejar obrigar uma criança, com risco de sua própria vida, a manter uma gravidez fruto de uma inominável violência? Rígidos princípios religiosos? Ou insanidade e crueldade? Estamos falando do caso ocorrido em Pernambuco da menina de nove anos que apresentou gravidez (de gêmeos!) como resultado de estupros seguidos que sofreu de seu padrasto, violência a que foi submetida desde os seis anos de idade.
A gestação foi interrompida no dia 04 de março último, às 10h da manhã, seguindo o protocolo do Ministério da Saúde que permite abortamento em casos de gravidez de risco ou quando a gestante foi vítima de estupro, ainda que o aborto continue sendo crime no país. O caso da garota pernambucana se enquadrava nos dois casos, já que a gravidez de fetos gêmeos também colocava sua vida em risco, pois a menina pesa apenas 36kg e mede 1,36m. Por ser muito pequena, ela não tem estrutura física para suportar a gravidez de um feto, muito menos de dois. É de se imaginar, ainda, os danos psicológicos a que seria submetida se fosse obrigada a levar essa gravidez a termo.
Para nossa surpresa – e indignação! –, entretanto, houve uma intensa movimentação de militantes religiosos contra a interrupção dessa gravidez tão perigosa, sob todos os aspectos, para essa pequena criança de nove anos. Até mesmo ameaça de excomunhão houve! Sob o argumento da defesa da vida, essas pessoas não se importaram em nenhum momento nem com a violência já sofrida por ela, nem com a real possibilidade que havia de a menina perder a própria vida. Se essa criança – que tem existência real e concreta, com uma história de vida, relações pessoais, afetos, sentimentos e pensamentos, enfim -, se essa menina não merece ter sua vida protegida, trata-se de defender a vida de quem? De uma vida em potencial ou um conceito, uma abstração? Quem tem o direito de condenar à morte uma pessoa em nome de se defender uma possibilidade de vida que ainda não se concretizou e não tem existência própria e autônoma?
Pensamos que se configura como pura crueldade essa intransigente defesa de princípios abstratos e de valores absolutos que, quando confrontados com a realidade cotidiana, esvaziam-se de sentido e, principalmente, da compaixão cristã. Seria possível imaginarmos o que Jesus Cristo diria a essa menina? Seria ele intolerante, inflexível e cruel a ponto de dizer a ela que sua vida não tem valor? Ou ele a acolheria gentilmente, procuraria ouvir sua dor e a acalentaria em seu sofrimento? Será que ele defenderia que ela sofresse mais uma violência ou usaria sua voz para gritar contra os abusos que ela sofreu?
Felizmente, a menina pernambucana pôde, graças ao respeito a um direito democraticamente conquistado, diminuir os danos das inúmeras violências que sofreu e a gravidez foi interrompida. Assusta-nos, porém, saber que, ao contrário dessa menina, outras tantas vidas têm sido ceifadas em nome de princípios intransigente, duros, violentos e nada amorosos. Assusta-nos o desprezo pela vida das mulheres. Assusta-nos que suas histórias sejam descartadas, que sua existência na Terra esteja valendo menos do que a crença autoritária de algumas poucas pessoas.
Para que a nossa democracia seja efetiva, as pessoas precisam ter o direito real de escolher. Por isso, defendemos que as políticas públicas de saúde reprodutiva e os direitos reprodutivos já conquistados sejam garantidos. Além disso, lutamos pela legalização do aborto, para que as mulheres que assim desejem, possam levar qualquer gravidez até o fim. Mas que as que não o desejam, não sejam obrigadas a arriscar suas vidas, ou mesmo morram, por se pautarem por valores éticos distintos.
(*) Católicas pelo Direito de decidir é um grupo feminista ligado à Igreja Católica que defende a discriminalização e a legalização do aborto
A MULHER NA INDÚSTRIA, NA CIÊNCIA E NA MEDICINA
Evelyn Reed
Alexander Golden Weiser enfatiza: “Em todas as partes do mundo a manutenção da família é garantida com maior regularidade e certeza pelas tarefas da mulher, ligada à casa, do que pelas do marido ou filhos caçadores que estão longe. Realmente nos povos primitivos, era um espetáculo habitual o homem voltar ao lar, depois de uma caçada mais ou menos árdua, com as mãos vazias e morto de fome. Portanto, as provisões vegetais deviam bastar para suas necessidades e para as do restante da família.” (Anthropology)
A primeira divisão de trabalho entre os sexos é freqüentemente descrita de uma forma muito simplificada e deformada. Diz-se que os homens eram caçadores ou guerreiros, enquanto as mulheres permaneciam no acampamento ou em casa para cuidar dos filhos e fazer a comida. Tal descrição dá a impressão de que a família desta época era idêntica à família moderna. Enquanto os homens se ocupavam de todas as necessidades sociais, as mulheres tratavam somente da cozinha e dos filhos. Este conceito é realmente uma grande distorção dos fatos.
Com exceção da divisão de trabalho na busca de alimentos, não existiam entre os sexos, nenhuma outra diferença, nem nas formas mais elevadas de produção, pela simples razão de que toda atividade industrial na sociedade, estava nas mãos das mulheres. Por exemplo, o cozinhar, não deve ser entendido como nós o entendemos na família moderna. Cozinhar era somente uma das técnicas que as mulheres adquiriram como resultado do descobrimento do uso do fogo e da capacidade de utilizar o calor.
Todos os animais da natureza temem o fogo e se afastam dele. E, sem dúvidas, o descobrimento do fogo tem pelo menos meio milhão de anos, inclusive antes mesmo da humanidade ter alcançado um nível completamente humano. (...)
Todas as bases técnicas da cozinha, que se seguiram ao descobrimento do fogo, foram inventadas pelas mulheres: cozinhar, assar, servir, etc. Estas técnicas implicavam em experiências constantes sobre as propriedades do fogo e sobre a utilização do calor. Foi precisamente graças a essas contínuas experiências, que a mulher conseguiu desenvolver as técnicas de conservação de alimentos. Com a aplicação do fogo e calor, conseguiu dissecar e conservar, para as exigências futuras, tanto animais quanto vegetais.
Mas o fogo representou muito mais. O fogo é por excelência, o instrumento da sociedade primitiva; pode ser comparado ao controle e uso da eletricidade e inclusive da energia atômica, na idade moderna. E foi a mulher quem desenvolveu as primeiras formas de indústria e, ao mesmo tempo, quem descobriu o uso do fogo como instrumento de seu trabalho.
A primeira atividade industrial da mulher estava centrada na busca de todo tipo de alimentos. Preparar e conservar a comida pressupõe a invenção de todo o equipamento subsidiário: vasilhas, utensílios, fornos, armazéns, etc. As mulheres construíram as primeiras dispensas, celeiros, depósitos para alimentos. Alguns desses celeiros consistiam em buracos cavados na terra, e revestidos de palha. Nos terrenos pantanosos ou úmidos, fincaram paus, e sobre estes construíram depósitos. A necessidade de proteger os alimentos dos répteis e outros pequenos animais, foi resolvida com a domesticação de outro animal, o gato. (...)
Foi sempre a mulher quem conseguiu distinguir as substâncias nocivas dos alimentos. Com o uso do fogo, transformava os alimentos, que em seu estado natural não eram comestíveis, em um alimento novo. (...)
Por exemplo, mandioca é venenosa em seu estado natural. Mas, a mulher conseguiu transformá-la em um alimento base através de um complicado processo de compressão, utilizando uma prensa primitiva para eliminar as substâncias venenosas e depois cozinhando-a para eliminar qualquer outro resíduo desagradável.
(...) O Dr. Dan Mackenzie catalogou uma centena de medicamentos homeopáticos descobertos pelas mulheres, precisamente devido ao seu profundo conhecimento da vida vegetal. (...)
Inclusive, as mulheres conseguiram transformar substâncias animais em medicamentos. Transformaram por exemplo, o veneno da serpente em um soro contra as mordidas deste réptil (igual ao preparado que atualmente conhecemos como antídoto). (...)
E foi neste contínuo reproduzir-se, de necessidades e soluções, que as mulheres construíram as bases para uma futura cultura mais elevada.
A TERRA DAS MULHERES
Revista Elle - 02.12.2009
Os Mosos, habitantes de uma cidade à beira do lago Lugu, no sudeste, vivem numa sociedade matriarcal, em que as mulheres têm voz ativa, a sexualidade é encorajada desde cedo e não existe a figura do pai. Elas são as provedoras da família.
Dois dos maiores símbolos de poder de uma sociedade – a propriedade privada e o nome de família – são passados de mãe para filha.
Não existe repressão sexual. Pelo contrário, elas podem se relacionar com quem bem entenderem. Depois de escolhido o parceiro, ele deve visitar a pretendida ao anoitecer e ir embora antes de amanhecer. Senão vira motivo de chacota na cidade.
Não existem relacionamentos convencionais. Casamento, nem pensar. As mulheres podem ter múltiplos parceiros, mas nunca irão morar com um deles. Os filhos que elas gerarem “pertencerão” apenas à família da mãe. A única figura masculina pertinente às crianças é a do tio, irmão da mãe.
Com todas essas particularidades, não é de espantar que as mulheres moso sejam mais extrovertidas que a maioria das chinesas, quase sempre sisudas, e que os homens tenham um perfil tímido, quase submisso.
A-Ke Dama, 27 anos, mora em uma casa em frente ao lago, junto com a mãe, A-Ke Bingmanamu, a chefe da família, ela diz:
“Tenho consciência de que a maneira como vivemos é muito diferente do resto do mundo”, mas somos muito felizes.”
Seus dois filhos são do mesmo pai, um fato pouco comum na região. Apesar disso, o “casal” não mora junto, não se vê todos os dias e ele não exerce o papel de pai – mesmo encontrando as crianças com alguma freqüência.
Já estamos juntos há alguns anos, mas só nos vemos quando temos vontade. Somos amigos, conversamos muito”,a maneira como as pessoas se relacionam fora daqui é triste. Para ficar junto, é preciso fazer um juramento perante a lei. Isso é uma pressão enorme para o casal. No meu caso, só dá certo porque não existe isso. Ele não faz parte do meu dia-a-dia. Nós nos encontramos à noite, poucas vezes por semana, quando queremos”.